Tuesday 7 September 2010

Vesti-me de ti...





Despi-me dos velhos farrapos que teimosamente me toldavam a alma de negro, onde o cheiro nauseabundo a enxofre açoitava o ar, irrespiráveis... minhas ruas eram um pântano, de lamas movediças... onde minha alma chafurdava, onde meu corpo definhava... onde o meu Ser desistia...
Os dias eram um não mais terminar de noites... escuridão, o breu... onde o Sol nunca brilhava e nem as estrelas se atreviam a espreitar... era o pântano, pestilento, movediço, era a lama... a lama dos meus dias feito noites.
E ela... a alma morria, lentamente... devagar... morria, deixava-se ir... e escorregava cada vez mais por entre o pântano, sentindo a lama a entrar-lhe nas veias... a povoar-lhe os pulmões, petrificando-lhe o sorriso... congelando-lhe as emoções... e ela... ali permanecia, num lamento, num sussurro... habituada ao breu, á noite... tacteando com as mãos as paredes movediças... pedia para não mais voltar.

Certo dia feito noite, por descuido ou distracção... uma nesga de luz se esgueirou janela dentro... a medo, e ainda cega pla escuridão que habitualmente me envolvia, decidi fitá-la... á luz... olhei-a... de relance, pensei voltar a olhar... mas o medo de voltar a entrar na luz que um dia se apagou... e que sem pudor me deitou ao pântano... era tal o medo... que corri... de volta ao velho armário, de seu cheiro a mofo, rebuscando nas gavetas as dores e as cicatrizes que por lá guardava... e abracei-as, eram negras, frias, sem cor, mas eram minhas... e a essas eu já as conhecia...

E lá fiquei noites e noites... a acarinhar estas mesmas dores, e cicatrizes e as feridas... sem as lamber, sem as querer sarar... ficando assim, sangrando... ajudavam-me a matar a Alma... que agora já lutava por ficar.


Foi a luz bem sei... a luz colocou uma centelha na Alma, tocou-lhe... abanou-a de mansinho... como quem atiça uma fogueira que teima em se desvanecer... e saí do armário, limpei-me da lama do pântano... vim até á janela... e sentei-me... adormeci... acordei e esperei... e lá estava finalmente a Luz, desta vez feita de Cor... olhei-a de frente sem medo, um arco-íris de cor inundou o quarto... fez frente ao velho armário... e como que num passe de magia... trancou as dores, cicatrizes e feridas a sete chaves... e deitou uma a uma ao pântano... e a Alma não lutou, ao invés deixou-se banhar por aquela Luz intensa de Cor... tragou-a... sem medo... tomou-a em suas mãos… pintou-se com as suas Cores... e foi assim que me vesti de ti... no dia feito dia em que me devolveste a Cor!

Silvia 6/01/2010

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